Você está aqui: Início Últimas Notícias Sistema prisional brasileiro intensifica violência, alertam pesquisadores
Para Camila Nunes, as facções são o efeito mais evidente da política de encarceramento. Ela explica que, no Brasil, esses grupos tidos como “crime organizado” são criados dentro das prisões, ou seja, dentro de estabelecimentos do Estado. “Esse não é um elemento trivial. E a gente continua apostando que a prisão vai solucionar os nossos problemas”, criticou.
A professora salientou ainda que o número de funcionários que trabalham nessas prisões não é suficiente para acompanhar a expansão da rede carcerária. “Você chega num cenário atual em que tem um agente penitenciário cuidando de um pavilhão inteiro, ou seja, um agente para 300 presos”, exemplificou.
Segundo ela, essa situação gera um problema de “cogestão”. “Quem faz essa gestão interna dos pavilhões não é o Estado, são os próprios presos, certo? Mas não são os presos num processo de autogestão, na verdade, são as facções ou os comandos”, esclareceu.
Camila Nunes também destacou que, no Brasil, o sistema de justiça criminal é baseado na atuação ostensiva da Polícia Militar e no flagrante. “Uma porcentagem absurda de pessoas que estão presas são em flagrante, ou seja, não há investigação”, afirmou. Ela argumentou que isso acarreta superlotação, com prisões de pessoas que estão na ponta das redes criminais que organizam e atuam no País. “Essas pessoas são presas e, dentro do sistema prisional, elas vão ser obrigadas a se inserir em redes que se consolidam ali dentro, e a prisão vai produzir as condições propícias para que essa violência e esse crime se intensifiquem”, ressaltou.
O defensor público do estado de São Paulo Renato de Vitto destacou que a sensação de que um número maior de prisões vai reduzir a criminalidade é questionável do ponto de vista científico. De acordo com ele, há estudos científicos que comprovam que o encarceramento acima de uma determinada taxa se torna, em vez de um elemento inibidor do crime, um fator que impede o combate à criminalidade.
Renato de Vitto comentou ainda sobre a necessidade de enfrentar a omissão da União no que diz respeito ao papel de coordenação da política prisional, fixando normais gerais e um modelo de governança. “Temos que começar a olhar a política penitenciária como um campo especializado de conhecimento e gestão e deixar de tratar isso como um anexo da discussão sobre segurança pública”, avaliou.
Segundo o defensor público, é imprescindível rever a questão do financiamento da União para os sistemas prisionais. Ele destacou que é necessário “não apenas gastar mais, mas gastar melhor”. “Quanto custa um preso federal? Dezoito mil reais. Evidente que você privar uma pessoa de liberdade e ativar políticas de reintegração social como forma de prevenção à criminalidade – abrindo alternativas para a trajetória daquele indivíduo – vai ser caro, e essa conta você vai ter que estar disposto a pagar”, frisou.
EXPERIÊNCIA MEXICANA
O professor da Universidad Veracruzana (México), José Alfredo Zavaleta Betancourt, compartilhou elementos da experiência mexicana em torno do controle estatal e conflitos internos. Segundo ele, a situação no México se caracteriza pelo aumento de polícias e reformas legais e institucionais inacabadas.
O professor também comentou sobre como a violência no México tem se regionalizado e se diversificado, destacando que, atualmente, estudos sobre a violência no país têm utilizado conceitos de geopolítica para caracterizar esses conflitos como “estado de guerra”, “uma guerra civil da nova geração” e “estado de exceção”. "Os conflitos internos em nosso país se caracterizam por 200 mil homicídios nos últimos 12 anos, 33 mil desaparecidos nos últimos 10 anos e uma taxa de impunidade de 96%. Essas cifras nos dão uma ideia da crise que experimentam nossas instituições de segurança e justiça”, informou Zavaleta.
A mesa foi mediada pelo presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Ceará (Copen/CE), Cláudio Justa.
BD/LF