Apesar de as eleições municipais terem sido encerradas no dia 30 de outubro do ano passado, quando houve segundo turno, o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) segue em diligências, investigando casos de supostas fraudes ocorridas durante e após o pleito de 2016. De acordo com o coordenador do Centro de Apoio Operacional Eleitoral (Caopel) do MPCE, o promotor de Justiça Emmanuel Girão, a maior dificuldade enfrentada pelo órgão é a diminuição nos prazos, que impossibilitou ações da Justiça Eleitoral que ainda estão em curso.
As principais fraudes encontradas estão relacionadas a compra de votos, como no caso recente de cassação do diploma da vereadora Lucimar Martins (PTC), conhecida como Bá, pela Justiça Eleitoral, além de abuso de poder econômico e de poder político. Algumas ações foram ajuizadas, mas, segundo Girão, após o período eleitoral as tramitações tendem a ficar menos céleres. "O grande problema dessas eleições foi a redução da campanha, pois não houve tempo adequado para se apurar, principalmente, uma coisa nova que ainda estamos apurando, que são doações fraudulentas".
O promotor lembra que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) enviou à Receita Federal uma relação de todos os doadores de campanha para se certificar se aquelas doações não ultrapassaram o limite de 10% dos rendimentos brutos do ano anterior, como prevê a legislação.
A Receita tem até o dia 30 de junho para comunicar ao TSE os casos suspeitos e, em seguida, o Ministério Público terá até o dia 31 de dezembro para entrar com representações, caso sejam confirmadas as irregularidades. Se forem julgadas procedentes as denúncias, os candidatos serão condenados a pagar multa e, a partir de decisão de órgão colegiado, tornam-se inelegíveis por até oito anos.
O próprio presidente da República, Michel Temer (PMDB), tem condenação desta natureza, visto que em 2014 doou acima do limite permitido para um candidato de São Paulo. "Os promotores estão atuando nas ações que estão em andamento. A ação da vereadora Bá, por exemplo, foi julgada por juiz de primeiro grau, mas existem outras ações como essa em todo o Estado. A qualquer momento pode-se cassar mandato de um prefeito ou vereador, visto as muitas ações em andamento", explicou.
Girão ressalta que muitos dos crimes cometidos ainda estão sendo apurados, pois não prescreveram. Como pessoas jurídicas não podem mais doar aos candidatos, há indícios de pessoas físicas que teriam sido utilizadas para "mascarar" o verdadeiro doador. Segundo o promotor, no Ceará, existem casos de empregados de empresas que fizeram doação para candidatos a prefeito, além de servidores de prefeituras que realizaram doações no mesmo dia, em mesmo horário, e às vezes até com os mesmos valores.
Falsidade ideológica
O promotor relata que coordenadores de campanha chegaram a justificar que os doadores "não queriam ter o trabalho" de fazerem a doação e o procedimento teria sido realizado pelos próprios representantes do candidato. Segundo ele, nesses casos, demanda-se uma investigação que pode chegar, inclusive, à cassação do mandato por crime de falsidade ideológica eleitora.
De acordo com Emmanuel Girão, com novas regrais eleitorais, que passaram a valer após minirreforma na legislação ocorrida em 2015, surgiram novas irregularidades, mas também novos mecanismos de investigação de delitos. O Ministério Público Federal (MPF), por exemplo, desenvolveu um sistema, o Sisconta Eleitoral, que está investigando as doações eleitorais e enviando dados para auxiliar os promotores. Há casos suspeitos, por exemplo, de beneficiários do programa Bolsa Família e de pessoas recebendo o Seguro Desemprego que fizeram doações para campanha de candidatos, o que seria inviável.
Para o coordenador do Centro de Apoio Operacional Eleitoral, a estrutura do Ministério Público não é a ideal, mas "com criatividade" se consegue trabalhar dentro das limitações. Emmanuel Girão destaca que, para as eleições municipais de 2020, haverá melhoria para o trabalho do Ministério Público, visto que foi aprovado na Assembleia Legislativa, no ano passado, o repasse de 15% das custas judiciais e extrajudiciais e de 5% dos emolumentos cartorários arrecadados no Estado ao Fundo de Modernização e Reaparelhamento do Ministério Público do Estado do Ceará.
Problemas
Segundo o promotor, um dos principais problemas do pleito de 2016 ocorreu em Fortaleza, uma vez que policiais militares teriam trabalhado em prol de uma das candidaturas postas e isso provocou uma reação dos juízes cearenses, que solicitaram a atuação da Força Nacional. Em 2014, a questão foi o aquartelamento das tropas militares, o que gerou a necessidade de se colocar um promotor eleitoral na Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops). A ação foi repetida no pleito do ano passado.
Emmanuel Girão afirma também que, no pleito municipal de 2016, mais uma vez candidaturas femininas foram lançadas em diversos municípios apenas para cumprir a legislação quanto à chamada cota de gênero. "A fraude existe porque o partido deveria, dentro de seus quadros, incentivar as mulheres na vida pública. Eles não se esforçam para isso e pedem par a o candidato homem conseguir uma mulher, que geralmente, não é candidata, não faz campanha, e no final não tem voto", denuncia.