O projeto é uma live mensal realizada pelo Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar (EFTA), órgão da Assembleia Legislativa do Ceará, que convida pessoas de diferentes áreas para uma conversa sobre direitos humanos. A live segue disponível no perfil do EFTA no Instagram.
MARCO TEMPORAL E RESISTÊNCIA
O mediador da live, o advogado Péricles Moreira, do EFTA, pontuou a importância da discussão sobre a gestão dos territórios pelos povos indígenas em um contexto de avanço do desmatamento e crimes contra esses espaços.
“Vemos uma normalização da negação da identidade dos povos, negação da existência dos povos até mesmo como justificativa para os processos de destruição”, comentou, indicando a relevância do debate sobre o marco temporal, “que interfere no processo de demarcação e interfere, inclusive, na existência dos povos indígenas”.
Alessandra Korap afirmou que o marco temporal – projeto que está em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) – é um crime, um absurdo contra os povos indígenas e o Brasil. “Como eles querem negar nossa identidade, nossa resistência, limitar tudo isso ao dia 5 de outubro de 1988?”, questionou. Para ela, “quem está querendo legalizar, aprovar isso é o próprio destruidor, aquele povo que quer entrar dentro do nosso território, negar nossa existência”.
Alessandra citou projetos que vêm sendo aprovados e promovem a exploração e destruição de territórios e afirmou que é essencial que o povo brasileiro se informe e se junte à luta contra esses processos de destruição e contra o marco temporal, pois as consequências são para todos.
TERRITÓRIOS INDÍGENAS
“Se não existe meio ambiente não existiria também povos indígenas, se não existe povos indígenas não existiria também meio ambiente”, afirmou Alessandra Korap, reiterando a importância dos povos na preservação dos territórios e na resistência. “Se tá preservando o meio ambiente, também tá preservando os povos indígenas, que tá ali dia a dia na luta”, comentou ainda.
Ela lembrou que começou a participar mais dos movimentos de luta e resistência quando percebeu que os direitos de bem viver do seu povo estavam sendo tirados. Segundo ela, tentaram indicar que as mudanças eram parte do desenvolvimento, mas é necessário se questionar se o povo quer esse tipo de desenvolvimento de violência.
Ao observar e participar desses momentos, Alessandra afirmou que sentiu a necessidade de lutar pelos territórios, pelo povo, mesmo em um cenário desafiante para mulheres no patriarcado. Ela lembrou que lideranças como Maria Leusa Munduruku, referência no Alto Tapajós, inspiraram-na a falar e lutar, conseguindo construir seu papel dentro desse processo de resistência.
PANDEMIA E MOBILIZAÇÕES
Os impactos da pandemia de Covid-19 na vida dos povos indígenas também foi assunto abordado durante a conversa. Segundo a liderança do povo Munduruku, foram muitos desafios na tentativa de defender a população contra a doença, em um território vasto e, em muitos casos, de difícil acesso.
Ela relembrou que muitos órgãos e entidades saíram das terras e, com isso, as invasões – e todos os problemas trazidos no processo – tornaram-se ainda mais perigosas, levando a doença para os povos. Alessandra ressaltou que, nesse contexto de pandemia, continuaram a sofrer ataques e violências e, por isso, foi necessário sair e se mobilizar como defesa.
“Se não tivesse tantos problemas no nosso território, não precisava tá reivindicando, fazer manifestação em Brasília”, comentou ao relembrar as manifestações, como a Marcha Nacional das Mulheres Indígenas.
Além disso, pontuou Alessandra, vive-se um momento de muitos ataques, de ameaças contra ela e muitas outras pessoas, pois quem luta contra questões como crescimento da soja, do garimpo, das madeireiras é visto como pessoa que “fala demais, que precisa ser eliminado”.
Em um cenário de tantos desafios, Alessandra convidou as pessoas a se informarem, pois há caminhos cada vez mais acessíveis, e se engajarem. Ela lembrou ainda da forte conexão com a natureza, afirmando que, “quando a gente sai da nossa terra, a gente leva a floresta pra Brasília, a gente leva o nosso território junto, não é só o nosso corpo, nós levamos a nossa vida, conectados com nossos filhos, com rios, com locais sagrados”.
SA/CG