Você está aqui: Início Últimas Notícias Responsabilidade estatal em mortes por intervenção policial é debatida na Alece
O parlamentar ressaltou que a CDHC tem realizado trabalho de acolhimento, denúncia e, sobretudo, reivindicação. “Temos buscado justiça. Justiça não é vingança, é a responsabilização, seja no âmbito individual ou institucional – ou seja, no Estado –, das violências que foram cometidas”, frisou. Roseno salientou ainda que a busca por reparação vai além da responsabilização criminal e visa ao acompanhamento psicossocial dos familiares das vítimas.
Entre os encaminhamentos da reunião destacam-se o pedido de apoio à criação do Sistema Estadual de Combate à Tortura e a recomendação à governadora do estado do Ceará – com base em recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – da estruturação do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, bem como a criação da Ouvidoria Externa Independente para Coleta de Denúncias no sistema de privação de liberdade.
Também foi requerido, ao MPCE, uma reunião para verificar lacunas; à CGD, dados sobre o andamento das denúncias e programas de prevenção à violência policial; à Defensoria Pública, fortalecimento da Rede Acolhe e do Núcleo de Atendimento às Pessoas em Privação de Liberdade e à Pefoce, autonomia na elaboração do laudo sem a presença do policial condutor ou penal.
Representante do Movimento de Mães e Familiares do Curió, Edna Carla destacou que estavam presentes na Alece 70 coletivos de diversos estados do Brasil para reivindicar justiça pelos seus filhos, pontuando que a morte de crianças e adolescentes por violência policial não se limita apenas ao Ceará. “Sete anos da Chacina do Curió e nenhuma resposta foi dada, muito pelo contrário. Aonde chegamos, o Estado, às vezes, quer fechar as portas para nós, não querendo nos receber e ouvir. Isso é muito adoecedor para qualquer mãe, em qualquer situação”, compartilhou.
Segundo Edna, essas mortes se dão, sobretudo, por serem jovens pobres. “Tem um sistema genocida, político, que é pra abater pobre”, afirmou. Ela informou ainda que o movimento pede, em nota técnica, aceleração da investigação dos casos e a criação de um Núcleo de Assistência Psicossocial para as mães de vítimas de violência estatal em todos os estados.
Vicente Alfeu Teixeira Mendes, da Controladoria Geral de Disciplina (CGD), explicou os trâmites de apuração de casos de morte por intervenção policial realizada pela CGD, destacando que, no ano passado, em apurações no âmbito da CGD, 52 servidores públicos foram demitidos – maior pena aplicada ao servidor. Vicente defendeu ainda a necessidade de trabalhar nos policiais uma formação mais humanizada e voltada para a cidadania.
Elizabeth Chagas, defensora pública, solidarizou-se com as mães das vítimas e afirmou que a Defensoria Pública do Ceará está à disposição das famílias, informando que o órgão conta com a Rede Acolhe, que presta assistência às vítimas de violência no Ceará. “Sei que isso devasta toda a família, isso marca toda uma existência, e a família precisa ser reconstruída e unir forças”, assinalou.
Élder Ximenes, promotor de Justiça do Ministério Público Estadual (MPCE), acentuou que, quando se trata de investigação de suspeitos dentro do sistema de justiça – como policiais –, o trabalho se torna muito mais difícil, uma vez que se está lidando com “uma pessoa especializada em escapar da prova”. Ele também destacou que, conforme pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas e Secretaria Nacional de Segurança Pública, 79,1% dos policiais civis e militares concordaram com a desmilitarização das polícias.
Thiago de Holanda, do Comitê de Prevenção à Violência da Alece, destacou alguns dados relevantes referentes às mortes por intervenções policiais. Ele apontou que, de 2013 a 2020, houve um aumento de 256% da violência policial no Ceará e que, mesmo em um ano atípico, como 2020, houve recorde de mais de 6.000 vítimas de letalidade policial – cerca de 17 por dia. “Isso é estarrecedor, revoltante e não podemos jamais normalizar isso”, afirmou. Segundo Thiago, todas as informações serão reunidas em nota técnica que, em breve, será divulgada pelo comitê da Alece.
Conforme Patrícia Mota, advogada e coordenadora da CDHC, no caso da Chacina do Curió, apenas oito de 44 réus estão atualmente aptos a julgamento no Tribunal do Júri. Entre os impeditivos para investigação e correta apuração dos casos, ela apontou a morosidade e omissão dos órgãos de controle, a criminalização das vítimas e o corporativismo e a complacência com a violência policial, que prevalecem mesmo quando os casos chegam ao Judiciário.
Talita de Araújo Maciel, presidenta do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (CEPCT), indicou que o comitê já buscou a Procuradoria-Geral de Justiça para ver a possibilidade de criar uma promotoria especializada em torturas e mortes por intervenção policial. “A gente sabe que existem estruturas especializadas na investigação criminal, mas, quando acontece um caso, não existe uma atribuição, um lugar seguro para que essas denúncias sejam feitas”, comentou.
Também participaram da reunião Alessandra Félix, do Coletivo Vozes de Mães e Familiares do Sistema Socioeducativo e Prisional do Ceará; Maria do Socorro Portela Alves, delegada da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS/CE); Leila Paiva, presidenta da Comissão de Direitos Humanos da OAB/CE; Mariana Barbosa, delegada de Detenção do Comitê Internacional da Cruz Vermelha em Fortaleza, e Erick Rastelli, assessor de proteção do Comitê Internacional da Cruz Vermelha.
BD/CG