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ATA DO SEMINÁRIO PROMOVIDO PELA COMISSÃO DE INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA - TAUÁ - QR Code Friendly
Terça, 19 Junho 2012 09:07

ATA DO SEMINÁRIO PROMOVIDO PELA COMISSÃO DE INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA - TAUÁ

  ATA DO SEMINÁRIO PROMOVIDO PELA COMISSÃO DE INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA, COM A CAMPANHA: QUEM CALA, CONSENTE – VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES É CRIME! REALIZADA NO DIA 8 DE MAIO DE 2012, NO LICEU DE TAUÁ.   SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS CLEITON MENDES: Bom dia, senhoras e senhores. A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, através da Comissão da Infância e Adolescência, tem a honra de realizar aqui, em Tauá, 18º Seminário Regional da Campanha: Quem Cala, Consente - violência sexual contra crianças e adolescentes é crime! uma parceria com a 15ª Crede e com a Secretaria Estadual da Educação.             A iniciativa tem como objetivo sensibilizar e conscientizar a sociedade cearense para o combate ao abuso e à exploração sexual infanto-juvenil. Além de Tauá, esse seminário recebe representantes dos municípios de Aiuaba, Arneiroz, Quiterianópolis e Parambu. O ciclo de seminários regionais está percorrendo as principais regiões do Ceará, reunindo representantes dos 184 municípios cearenses. Até o final deste mês, a Campanha: “Quem Cala, Consente” terá percorrido 20 municípios onde estão localizadas as Coordenadorias Regionais de Desenvolvimento da Educação (Crede). Desde já a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, na pessoa da presidente da Comissão da Infância e da Adolescência, deputada estadual Bethrose, agradece a 15ª Crede de Tauá e a Secretaria Estadual de Educação pelo apoio.             Para compor a Mesa de abertura do Seminário: Quem Cala, Consente! convidamos as personalidades: -Deputada estadual Bethrose, presidente da Comissão da Infância e Adolescência (aplausos); -Professora Marluce Torquato, coordenadora da 15ª Crede de Tauá (aplausos); -Dr. Bráulio Fernandes, Promotor de Justiça de Tauá (aplausos); -Genilda Dias, secretária da Assistência Social de Arneiroz (aplausos); -Francisco Douglas Pereira, Conselheiro Tutelar de Quiterianópolis, representando todos os conselheiros da região (aplausos); -Elisângela Gonçalves Viana, Coordenadora do CREAS de Tauá (aplausos).             Convido a todos a ficarem de pé para a execução do Hino Nacional. (Execução do Hino Nacional – aplausos).             Para iniciar os trabalhos do 18º Seminário Regional da Campanha Quem Cala, Consente - violência sexual contra criança e adolescente é crime! convidamos para fazer uso da palavra a presidente da Comissão da Infância e Adolescência da Assembleia Legislativa, deputada estadual Bethrose. (Aplausos). SRA. PRESIDENTE DEPUTADA BETHROSE (PRP): Bom dia a todas e a todos.             Gostaria de cumprimentar a Mesa com a presença do Dr. Bráulio Fernandes, Promotor de Justiça de Tauá; a Secretária da Assistência Social, Genilda Dias, de Arneiroz; a Coordenadora da 15ª Crede de Tauá, Professora Marluce; Francisco Douglas, Conselheiro Tutelar de Quiterianópolis, representando todos os conselheiros da região; a Elisângela Gonçalves, coordenadora do CREAs, também representando aqui todos os profissionais que estão neste seminário aqui, em Tauá. Cumprimentar também todos os educadores, gestores da educação, professores, diretores e, principalmente, os alunos da Rede Estadual de Ensino. Muito obrigada, de coração, pela presença e pelo apoio a este seminário, que é uma campanha da Assembleia Legislativa, com total apoio do Presidente Roberto Cláudio. Contamos neste seminário com uma boa música da Banda Quarto Nove, e a vinda desta banda só foi possível com o apoio do nosso presidente. Hoje é o 18º seminário. Nós andamos em todas as regiões do Estado do Ceará levando esse tema sobre violência sexual que é o abuso e a exploração. Tivemos o total apoio principalmente da Crede de todos os municípios que fazem parte da Coordenadoria Regional para o Desenvolvimento da Educação, mobilizando e sensibilizando a sociedade, os poderes públicos municipal, estadual e federal e as famílias, para poder combater essa prática que é a violência sexual, tanto o abuso como a exploração.             Eu faço parte da Comissão da Infância e Adolescência da Assembleia, estou como presidente, e como vice-presidente está a Deputada Fernanda Pessoa, e como membros titulares estão: Deputada Eliane Novais, Deputada Patrícia Saboya, Deputada Inês Arruda. E nós decidimos não fazer essa mobilização não só no dia 18 de maio e depois esquecer; e ao ler as notícias nos jornais que uma criança de sete anos foi abusada pelo padrasto, por um primo ou por uma pessoa mais próxima. O objetivo maior é exatamente mobilizar e sensibilizar a todos. O que é sensibilizar? É comover mesmo à sociedade, a família, a escola, por terem um papel relevante de poder proteger nossas crianças, principalmente como o abuso sexual. É muito difícil uma autoridade poder proteger de um abuso. A gente quer orientar principalmente a família e a nós membros que fazemos parte da sociedade; geralmente esse tipo de crime acontece exatamente dentro de casa, é uma pessoa conhecida, de tal forma que se a criança falar para qualquer um de nós que uma pessoa da sua família, uma pessoa que você ama e está fazendo isso com o seu filho, a primeira reação é não acreditar na criança. E é exatamente isso que a gente não quer. Uma das maiores prevenções desse tipo de crime é exatamente ouvir a criança e acreditar nela, e depois informar sobre esse tipo de crime, porque não dá mais para admitir que aconteça esse tipo de prática com as nossas crianças. É um tema difícil para se falar porque é constrangedor. Geralmente a pessoa que pratica esse tipo de crime a gente quer muito bem, está dentro do convívio social, está dentro da nossa família, e como é que a gente vai desconfiar de uma pessoa dessas? Por isso a gente vai fechar os olhos e não vai falar nisso? Antigamente era assim. Eu tiro pela experiência da nossa palestrante, a Dra. Helena Damasceno, escritora do livro “Pele de Cristal,” e foi abusada antes da existência do nosso Estatuto da Criança e do Adolescente; antigamente isso era abafado; hoje não dá para ser discutido como tabu não! A gente tem que falar porque o abusador se aproveita desse silêncio e das pessoas não quererem falar sobre o assunto porque é constrangedor, mas nós temos que falar, nós temos que denunciar. Uma das formas de prevenção para poder elaborar políticas públicas em cima desse tema é exatamente a denúncia. E é através desse do Disque-100, é nacional, ligado à Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República. Basta discar 100 de qualquer parte do Brasil, e funciona diariamente das 8 às 22 horas, inclusive finais de semana e feriados; a ligação é totalmente gratuita, e você não precisa se identificar. Na hora que ligar um, zero, zero – 100, a tele-atendente é qualificada para fazer esse tipo de atendimento; e o prazo da denúncia é de até 24 horas para entrar em contato com o local de denúncia no seu município. Eles entram em contato com o Conselho Tutelar para analisar o caso e começa a investigação; você recebe um protocolo, e eles ficam entrando em contato para saber se está indo à frente a sua denúncia.             O mais importante é não calar, como diz a Campanha: Quem Cala, Consente! Nós precisamos denunciar. E o número principal para denunciar é o Disque-100. Eu estive em Brasília e vi a seriedade desse sistema que acontece desde 2003, já tiveram várias melhorias. Eu acho que está na hora de a gente não esquecer mais esse tipo de violência, e a gente se choca na hora que vê no jornal criança de sete anos abusada, o pai... A gente vê em todos os municípios. São 184 municípios, inclusive em Fortaleza existe esse tipo de violência. Dizer que não existe esse tipo de abuso sexual em determinado município, isso não é verdade. O que está faltando aí é denunciar, é mobilizar mesmo. Nós andamos em todas as regiões, primeiramente em Itapipoca, e foram mobilizados 15 municípios, porque a Crede de Itapipoca coordena 15; lá nós tivemos um público de 600 pessoas. Quando são 15, a gente tem um público de 600; quando a Crede coordena 6 municípios, tem um público entre 150 e 200 pessoas. Eu sei que no final nós já mobilizamos mais de 18 mil pessoas. Com isso nós estamos formando multiplicadores. É muito gratificante quanto ao retorno desse seminário. Nós já recebemos mais de 120 Planos de Ações Estratégicas com o relatório, fotografado, e vendo que as escolas realmente fizeram esses planos com ações simples, como ir para a rádio e falar, do mesmo jeito vocês poderão fazer, e os pais poderem ficar alertas quanto às suas crianças se sendo abusadas. Conforme mudança brusca de comportamento físico e emocional, de uma criança e de um adolescente, elas poderão estar vivenciando situação de violência. Claro que o físico é bem mais fácil de perceber que o emocional.             Eu vou listar algum comportamento para se perceber que a criança está sendo abusada. É muito bom que a escola, a família e a própria comunidade fique alerta sobre esse tipo de comportamento porque pode salvar a vida de uma criança. Tenho dito que, dentre esses 20 seminários que nós estamos realizando, com o apoio de todos, se a gente conseguir salvar uma criança, eu já fico satisfeita. Geralmente a criança quando está sendo abusada tem uma mudança no comportamento bruscamente: come demais ou deixa de comer; tem uma apatia, agressividade, perturbação no sono, pesadelos frequentes, suores, agitação noturna. Essa criança de 7 ou 8 ano se masturba! Como é que uma criança de 7 ou 8 anos pode se masturbar? Alguma coisa está errada nisso. Qualquer coisa a criança chora e tem uma tristeza sem causa aparente; tem uma diminuição no rendimento escolar; perde a baixa autoestima, de tal forma que para ela nada tem graça, é uma tristeza mesmo. Só um caso desse isolado não significa nada, mas o conjunto dessas ações juntamente com os comportamentos físicos, e geralmente você pode observar roupa rasgada manchada de sangue; secreção vaginal ou peniana; hemorragia vaginal ou retal; dificuldade em caminhar; infecção urinária; hematomas e escoriações na região genital e mamária; doenças sexualmente transmissível. A gente vê crianças de 10, 11 anos com DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis).             Família, escola e comunidade têm a obrigação de ficar alerta nesse tipo de sintomas. Depois que uma criança é abusada, a sua vida nunca mais será a mesma. Essa criança vai precisar de um acompanhamento através de um profissional do CREAs que acompanha a família.             Peço, encarecidamente, que cada escola possa fazer o seu PAE - Plano de Ação Estratégico, serão dez ações que vocês vão realizar no período de seis meses. No seminário de hoje nós só vamos realizar dois passos, o primeiro e o segundo, os outros nove passos vocês irão realizar no município de origem de vocês.             Agradeço novamente a presença de todos da Mesa, o promotor, do secretário de ação social, o conselheiro tutelar, o profissional do CREAs, também da professora Marluce, de juntos combatermos esse tipo de crime. Eu tenho certeza que juntos, numa ação conjunta mesmo, podemos combater esse tipo de crime que é o abuso sexual.             Bom dia para todos. Bom seminário. Muito obrigada. (Aplausos). SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS: Convido para fazer uso da palavra a professora Marluce Torquato, coordenadora da 15ª Crede de Tauá. SRA. MARLUCE TORQUATO: Nosso bom dia todas e todos aqui presentes, dizer da nossa satisfação de receber todos vocês. Cumprimentar a Deputada Bethrose, e dizer da importância desse evento, e parabenizar pelo trabalho que vocês estão desenvolvendo na Comissão da Assembleia Legislativa, e a gente sabe que é da mais alta relevância discutir essas temáticas polêmicas, porque os efeitos quando não discutidos e não cuidados pelos poderes públicos podem ser catastróficos. Ressaltar que a satisfação da Crede em está sendo parceira no desencadear deste evento é muito grande, por saber da importância que a educação tem nesse contexto.                            Quero cumprimentar a nossa Genilda Dias, secretária do vizinho município de Arneiroz, e dizer da importância também da assistência social, e em seu nome estender o nosso cumprimento à Elisângela Viana, coordenadora do CREAs do município de Tauá, é assistente social, e já faz um trabalho muito importante dentro das Comissões de Abuso, tem toda uma história de luta contra esse tipo de violência. Estender os nossos agradecimentos aos conselheiros tutelares da região no nome de Douglas, do município de Quiterianópolis, seja muito bem-vindo. Dizer assim da satisfação enorme ter o nosso promotor que cuida da infância e da adolescência, o Dr. Bráulio, e já esteve conosco em outros momentos lá na Crede, desenvolvendo seminários, é um parceiro. Muito obrigada.             Quero pedir permissão à Mesa para cumprimentar a todos os nossos diretores, coordenadores escolares, a equipe da Crede que esteve junto com o pessoal da Assembleia nessa parceria, e pedir licença para fazer uma apresentação dos nossos alunos. Nós temos aqui o pessoal do Liceu de Tauá (aplausos), o nosso diretor João Filho está ali com alguns coordenadores, obrigada pelo apoio. Quero cumprimentar o pessoal de Parambu, Escola Ana Noronha e Escola Joaquim Filomeno Noronha, diretores, professores, coordenadores. Muito obrigada. (Aplausos).             Agradecer aos nossos alunos da Escola Profissional Monsenhor Eudorico de Andrade, de Tauá (aplausos), eles têm uma missão importante de empreendedorismo, sejam bem-vindos. Cumprimentar os nossos alunos de Arneiroz, a Helena, o pessoal de Arneiroz, muito bem-vindos (aplausos); de Auiaba, a Andreia, diretora, a coordenadora e os alunos (aplausos); do CEJA, Luzia Araújo Freitas (aplausos); da escola Antônia Vieira Lima, de Santa Tereza, a terra do vice-governador Domingos Filho, muito obrigada a vocês (aplausos); professora Elvira e todos os educadores e professores de Quiterianópolis, sejam muito bem-vindos (aplausos). Essa é a nossa equipe de trabalho, é uma equipe forte. A nossa Crede, em termo de número de municípios é uma das menores, tem cinco municípios, mas em termos de extensão territorial é muito grande. O município de Tauá tem 4.300km²; Aiuaba e Parambu são enormes também em extensão, e a gente tem 22 extensões de matrículas de ensino médio que funciona em escolas municipais.              A gente tem o foco dos alunos do terceiro ano que se encontram com a gente e podem ser esses formadores de opinião nessa temática da mais alta relevância. A gente tem a missão de trabalhar de forma intersetorial: poderes públicos, judiciário, Assembleia Legislativa, poder executivo, assistência social, educação, conselho tutelar, CREAs. Todos esses organismos, essas entidades precisam estar juntas.             Essas cartilhas que vocês receberam, procurem ler com atenção para identificar esses abusos porque, muitas vezes, alguém pode estar sofrendo determinado tipo de violência e nem se ligar. Esse é o momento para a gente discutir e se preparar melhor, identificar, denunciar, encorajar os outros, por ser um tema polêmico, difícil; muitas vezes a justiça tem dificuldade para ter as comprovações, a gente sabe das burocracias que envolvem todas essas questões.             Eu vou parafrasear o educador Paulo Freire que diz da importância que tem a educação para a mudança de comportamento. No século XXI a gente tem vivido uma inversão na mudança de valores, e isso tem trazido comportamentos diversos e tem nos desafiado a lidar com essas mudanças comportamentais, dentre elas a questão do abuso e da violência sexual contra crianças e adolescente.             Eu quero agradecer de forma muito especial o apoio e a presença da nossa Secretária-adjunta da Educação de Tauá, Salete Bonfim, por favor, fique conosco à Mesa (aplausos); é uma pessoa que já tem uma história também na assistência social e tem sido uma parceira.             Informar que chegou o pessoal do Conselho dos  Direitos da Criança e do Adolescente do município de Parambu, sejam bem-vindas a este evento (aplausos).             Agradecer a vocês; e colocar a nossa equipe da Crede à disposição durante todo o dia de hoje para fazermos um excelente trabalho, e nos colocar à disposição para estarmos constantemente ligados nesse tema, identificando, denunciando, discutindo, desenvolvendo projetos, de modo que nós possamos juntos combater essa violência. Como eu estava colocando o Paulo Freire, se a educação não mudar a sociedade, sem ela também não haverá mudança. A gente acredita no poder da educação dentre os muitos desafios que a gente tem enfrentado, de elevar a aprendizagem dos nossos alunos e dar melhores oportunidades para essas crianças e jovens está o de dar a oportunidade de viver bem, dignamente, com a mente sadia, livre de qualquer tipo de violência, de qualquer abuso e tampouco de violência sexual.             Muito obrigada a todos vocês pela presença; sejam todos bem-vindos, sintam-se abraçados. Estamos à disposição de todos. Bom dia; que Deus nos abençoe. (Aplausos). SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS:          Convido para fazer suas considerações o Dr. Bráulio Fernandes, Promotor de Justiça de Tauá. SR. BRÁULIO FERNANDES: Bom dia a todos.             Cumprimentar os integrantes da Mesa, a Deputada Bethrose  me convidou para falar sobre um pouco do trabalho do Ministério Público nessa área do combate à violência infanto-juvenil; cumprimentar a professora Marluce Torquato, coordenadora da 15ª Crede de Tauá; Francisco Douglas Pereira, Conselheiro Tutelar de Quiterianópolis, está aqui representando todos os Conselheiros Tutelares da região; Elisângela Gonçalves Viana, Coordenadora do CREAs de Tauá; Genilda Dias, Secretária da Assistente Social de Arneiroz.             Para quem não me conhece, eu estou em Tauá representando o Ministério Público do Estado do Ceará na área da infância e da adolescência, desde novembro do ano passado; sou Promotor de Arneiroz, comarca vinculada a Tauá. No momento Tauá conta com mais uma Promotora de Justiça, a Dra. Lorena, e ela cuida de outras áreas do Ministério Público, como defesa do patrimônio público e outras áreas. Eu cuido da defesa da saúde porque não existe o promotor da 2ª promotoria e cuido também da infância e adolescência, que é a 3ª promotoria da qual eu sou titular, também sou promotor eleitoral de Tauá.             Entrando no assunto da palestra de hoje que é a violência sexual contra crianças e adolescentes. Qual o papel do Ministério Público nessa rede de órgãos que existe para combater esse problema social? O papel do Ministério Público é denunciar os agressores à justiça sobre os casos comprovados de abuso sexual. Esses agressores serão processados, e se houver prova convincente serão julgados e condenados, e cumprirão a pena feita pelo mal que estão cometendo em relação às crianças e adolescentes. Mas para isso nós dependemos de outros órgãos como o Conselho Tutelar, como vocês bem sabem, é eleito pela própria população de cada município; eles estão na rua recebendo reclamações, denúncias e informações. Eles, na verdade, é que informam ao promotor de justiça desses problemas de violência sexual. Eles mandam um relatório para o promotor de justiça dizendo: Foi uma pessoa lá no Conselho Tutelar e disse que na família “x” determinada criança está sendo abusada sexualmente. Primeiro a gente pede para que o Conselho Tutelar realmente averigúe se isso é verdadeiro. Muitas vezes já averiguou, tem o relatório detalhado e manda, dependendo do caso, para a polícia investigar a ocorrência de crime, e pode ser, por exemplo, de estupro de vulnerável. O estupro de vulnerável é da pessoa que tenha até 14 anos, ou seja, independe do consentimento da criança ou do adolescente se ela for abusada, o agressor será processado, julgado e condenado por esse crime que é grave, tem uma pena de 8 a 15 anos, e cumprirá em regime de reclusão, na cadeia, no presídio. Além disso, a gente também recebe denúncias do Disque-100. Antes, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em Brasília, enviava essas denúncias para a Procuradoria de Justiça, para os Centros de Apoios do Ministério Público, em Fortaleza, e nos enviavam para pedir ao Conselho Tutelar fazer um relatório sobre aquele caso. Agora a orientação é que a Secretaria de Direitos Humanos envie essas denúncias diretamente ao e-mail do promotor. Nós enviamos até o nosso e-mail, o endereço da promotoria de Tauá para a Secretaria de Direitos Humanos em Brasília, e eles vão enviar esses casos denunciados através do Disque-100 diretamente para o meu e-mail, e daí eu vou verificar se realmente tem procedência ou não. Como eu vou verificar isso? Eu envio para o conselho tutelar fazer um relatório. O conselho tutelar vai visitar essa família, os vizinhos, as pessoas que têm conhecimento do fato e vai mandar um relatório para a promotoria. Dependendo do que for mandado para a promotoria, eu envio para a polícia o caso para ser investigado; se for um caso de crime, do código penal. E no caso da criança, eu posso enviar a criança para o CREAs, uma vez que a criança teve seus direitos violados. O CREAs tem vários programas sociais, conta com assistente social, com psicólogos, com uma equipe multidisciplinar para cuidar dessa criança, dessa família, para orientar, para acompanhar, enfim para tentar minimizar os efeitos ou até resolver esses problemas que muitas vezes ocorrem, e também trabalhar com o aspecto psicológico da criança e dessa família, e muitas vezes é uma família desestruturada social e psicologicamente.             O Estatuto da Criança e do Adolescente combate também esses tipos de violência, no art. 8 diz que hotéis, motéis, pensões e estabelecimentos congêneres não podem receber criança ou adolescente desacompanhado dos pais ou de responsável legal. Por sua vez, crianças e adolescentes não podem viajar para outras comarcas, para outras cidades, para outros estados, desacompanhados dos pais, exceto se tiver autorização da autoridade competente.             Por fim, dizer mais uma vez que a gente conta com o apoio do conselho tutelar. É importante que a população conheça os conselheiros tutelares da sua cidade. Contamos com o apoio do CREAs que é um órgão importantíssimo, da Secretaria de Assistência Social do Município. Acho muito louvável que a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará tenha tido essa iniciativa de fazer esse seminário para orientá-los e para formar multiplicadores, como a deputada aqui já falou.             Outra forma de abuso que o ECA proíbe é a pedofilia, é justamente filmar crianças despidas ou em aspectos eróticos, simulando sexo e colocar na Internet, no celular e sair divulgando. Isso também nós combatemos com vigor.             Nós queremos realmente que vocês colaborem com o Ministério Público notificando esses casos ao conselho tutelar ou então no Disque-100, que é um número bem fácil de memorizar. Se vocês souberem de alguma coisa acontecendo com alguma criança, com algum adolescente, vocês que são adolescentes-jovens, comuniquem para algum dos órgãos ou mesmo diretamente ao Ministério Público; estamos abertos a essas denúncias, por ser muito importante para a sociedade, para o Estado do Ceará que as suas crianças não sejam vítimas de violência e abuso sexual, uma vez que essa criança vai se tornar um adulto, e poderá se tornar um adulto também problemático, caso não tenha esse apoio do poder público e da sociedade como todo.             Combater a violência sexual não é só uma tarefa do Ministério Público e dos órgãos da rede proteção social, é uma tarefa de todos: sociedade, Estado e família.             Queria agradecer o convite para participar deste seminário. Infelizmente não vou poder ficar até o final, porque além de Promotor da Infância e da Juventude eu trabalho com todos os tipos de crimes que não envolve crianças e adolescentes também vem para mim para me manifestar a esse respeito. A Dra. Lorena no momento está de férias, e eu estou substituindo-a, ou seja, estou nas quatro promotorias e na promotoria de Arneiroz. Peço desculpas por me ausentar. Estarei sempre aberto a esses convites importantes. Muito obrigado. (Aplausos). SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS: Convido para fazer uso da palavra a senhora Genilda Dias, Secretária da Assistência Social de Arneiroz. SRA. GENILDA DIAS: Bom dia a todos.             Gostaria de cumprimentar a Deputada Bethrose, o Promotor Bráulio Fernandes, a senhora Marluce Torquato, a subsecretária de Educação Salete Bonfim, a Coordenadora do CREAs Elisângela, e o Conselheiro Tutelar Douglas.             Eu gostaria só de falar um pouquinho sobre a minha experiência como Secretária de Assistência Social sobre o assunto. Lá nós temos o conselho tutelar que trabalha muito a respeito desse tema, e temos o CRAS; lá nós não temos o CREAs. Os profissionais do CRAS trabalham muito em cima do que o promotor pede, com isso estão sobrecarregados. E não existe essa intersetorialidade igual à educação, já que é na educação que a gente vai combater esses abusos, porque a família vai ser trabalhada; nas reuniões de pais, eles serão trabalhados. Na assistência social é como se a gente estivesse trabalhando apenas os efeitos. As causas, os momentos principais estão lá na família. Nas reuniões, na escola, no dia a dia é lá na escola, é lá na família. E lá na assistência social, o conselho tutelar já é mais complicado. Eu fiz questão de dar esse depoimento.                        Outra coisa que eu achei importante foi esse planejamento que a deputada falou que não seja apenas uma vez no ano. Nós comemoramos o ano passado e sentimos dificuldades até de levar a educação para fazer parte daquela semana comemorativa, a assistência social com CMDK e o conselho tutelar, fazer o planejamento, com a educação e tal. É bom envolver mais a família, a sociedade e todos estejam preparados para defender as nossas crianças e os nossos adolescentes. E nós jovens, principalmente, que temos a mente mais aberta, que sejamos mais atuantes na sociedade, bem mais do que os adultos, já que os jovens têm um espírito de luta. Nós somos agentes na massa, somos capazes de mudar o mundo. Os jovens são capazes de mudar mundo. Então vamos mudar isso aí. Então vamos à luta. Cada um sendo fermento na massa vai mudar.             Um abraço para cada um de vocês. E vamos confiar. Tudo de bom. Obrigada. (Aplausos). SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS: E para finalizar a fala das autoridades, com a palavra a Presidente da Comissão da Infância e Adolescência, Deputada Bethrose. SRA. PRESIDENTE DEPUTADA BETHROSE (PRP): Eu gostaria que vocês anotasse o e-mail, e você poderá também denunciar além do Disque-100: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo., e para denunciar pornografia infantil você poderá denunciar através do site que é www.disque100.gov.br. Mais uma vez agradecer a todos os representantes do município Aiuaba, Arneiroz, Quiterianópolis, Parambu e Tauá. SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS: Para dar continuidade aos trabalhos do 18º Seminário Regional da Campanha: Quem Cala, Consente - Violência Sexual Contra Crianças e Adolescente é Crime! realizado no município de Tauá, agradecemos as autoridades que abrilhantaram a Mesa de honra e os convidamos para sentarem-se na plateia.             Convido para ministrar a palestra a psicóloga Helena Damasceno, também é escritora e já lançou o livro “Pele de Cristal,” livro este que ela tem aqui alguns exemplares e, no final do evento vocês poderão adquirir o livro autografado. SRA. HELENA DAMASCENO: Bom dia todas e a todos.             Como a deputada bem disse, eu sou sobrevivente de violência sexual intrafamiliar. Às vezes eu digo que fui vítima de violência sexual, mas na verdade, eu sou sobrevivente de violência sexual intrafamiliar, que é uma violência que acontece dentro da família, por um período, como bem falou a deputada, onde ninguém discutia violência, ninguém sequer ousava falar que a família não era um espaço de insegurança, de fragilidade. Ao contrário, a família era um elemento absolutamente fantástico, de total segurança, de aprendizado, de conforto, de carinho. Nem sempre é assim. Vinte anos atrás, onde não existia Estatuto da Criança e do Adolescente, onde não existia Conselho Tutelares, Conselho de Direitos, CREAs, onde não existia conselho e nada, absolutamente nada, o silêncio era bem maior, o tabu era bem maior sobre o caso.             Então eu e um número que é inimaginável de mulheres e de homens vítimas 20 anos atrás e hoje somos adultos. E o que fizemos de nós e aonde vamos com essa história toda.             O meu objetivo em publicar o livro e falar sobre violência, expor a minha história, é bem no sentido de dizer que as consequências, as reticências psicológicas de um abuso sexual são os mesmos de vinte anos atrás, de ontem, daqui a vinte anos. Só que hoje a gente tem uma rede que pode atuar. Existem hoje adultos que as crianças e adolescente podem contar, porque na minha época eu não podia contar com absolutamente ninguém. Ninguém mesmo. E hoje não. Existe uma rede que a gente pode contar. É fato que a rede ainda precisa melhorar em alguns aspectos, mas já evoluímos tanto. E a minha história é uma de o quanto melhorou e evoluímos.             Eu começo sempre dizendo uma frase de Clarice Lispector, que eu adoro e diz muito de como eu vim parar aqui: “Eu antes tinha querido ser os outros para conhecer o que era eu”. Entendi então que eu já tinha sido os outros. Isso era fácil. Minha experiência maior seria ser o outro dos outros; e o outro dos outros era eu. Tem uma música do Biquíni Cavadão que diz assim: “Como é difícil de viver carregando um cemitério na cabeça”. Uma pessoa vítima de violência sexual tem exatamente essa sensação de carregar um cemitério na cabeça. Detalhe: um cemitério com fantasmas ativos, com aquelas correntes arrastando, tipo um filme de terror. É assim que uma vítima de violência sexual vive 24 horas por dia quando ela não tem a intervenção dessa violência; quando essa violência não é interrompida; quando ela não tem nenhum atendimento, nenhuma intervenção psicológica, emocional, afetiva, social, ela pira.             Vou fazer 39 anos dia 13 de julho, por sinal, é o dia que comemoramos o aniversário do Estatuto, e eu tenho muito orgulho de saber que ele nasceu no meu dia; sei da sua importância e da falta que ele me fez há vinte e cinco anos, quando eu não podia fazer nada a não ser ficar em silêncio absoluto. E todos esses mitos: por que você não falou? Ao longo da vida me perguntaram muito isso: mas por que você não disse nada? Como se fosse muito fácil, e absolutamente fácil chegar para alguém e dizer: na minha casa tenho um tio, tem um primo, o meu pai, meu padrasto, meu irmão que está abusando sexualmente em mim. Como é que se diz isso?! Primeiro porque falar sobre sexo, e ainda por cima sobre abuso sexual, é muito difícil, é um tabu. Segundo como é que você vai falar de alguém que você ama, admira, confia, e abusou sexualmente de você? Como você chega para a sua mãe e diz que foi o pai, foi o irmão, o padrasto? Existe uma série de sistema envolvido nessa família, um contexto inteiro, e faz com que essa criança esteja vulnerável àquela situação e se cale, se omita, ou porque ela é ensinada a não falar, ou por medo, por coação mesmo, por pavor.             Eu terminei de escrever um segundo livro, e ainda está em revisão e eu estou querendo acrescentar alguns capítulos. E pretendo lançá-lo este ano ainda. Mas aqui no “Pele de Cristal,” essa divisão que eu faço da minha história é apenas didática, não tem essa divisão de forma clara por ser um bate papo. Converso comigo e com você o tempo inteiro.             Eu divido a minha história em três momentos. O primeiro eu chamo de exercício direto de violência. O segundo de exercício indireto de violência. E o terceiro de ressignificação.             Eu fui vítima de violência sexual, eu brinco dizendo que sou da era das cavernas porque não tinha internet, não tinha celular; para falar com alguém ia à casa da pessoa, no máximo telefonava. Eram tempos difíceis, bem mais complicados que para vocês hoje com a fluidez, com a rapidez das coisas.  Mas eu fui vítima por um período muito longo, não foi por um ano, uma vez, duas vezes não. Eu fui vítima mais ou menos dos meus 5, 6 anos de idade até aos 19, 20 anos de idade. Um período muito longo! E por isso mesmo que é interessante desmistificar alguns conceitos. Aquela história de que: -Ah, se a menina não está falando é porque ela gosta! -Ah, quando ela crescer, esquece! -Não, não é nada não, isso passa! As marcas da violência sexual são profundas e invisíveis, porque elas não estão na pele, algumas até estão quando estão envolvidas com violência física, mas a maioria delas está guardada no íntimo, no seu espaço interno. Eu digo muito que é no meu quarto pessoal. No quarto pessoal está toda aquela bagunça, está todo aquele transtorno. Por que durou tanto tempo? Por que as pessoas não falam, afinal? Abuso sexual intrafamiliar, é o que acontece dentro de casa. É claro que existe abuso fora de casa, lógico! Mas isso não é estatística maior; 93% dos casos de violência sexual acontecem dentro de casa, por pessoas que as crianças confiam, amam e admiram. Esse é o grande e principal motivo que alimenta o silêncio. A afetividade se confunde; a criança está se desenvolvendo. A criança, o adolescente não consegue compreender a vilania, a aspereza, a profundidade dessa violência. E de repente quando percebe, está envolta de uma teia de sedução unilateral, de uma violência extremamente cruel, perversa. E daí já estará atado. Outro motivo.  Violência sexual acontece como se fosse 2+2=4. Nós seres humanos não somos uma matemática exata, ao contrário, somos complexos, temos subjetividade muito ampla, profunda. A violência sexual nunca vem sozinha, é como se fosse uma caixinha e tivesse dentro dela a omissão, a negligência, o chamado de bulling. Na verdade são só aquelas coisas que se dizem para os filhos, pelo menos me disseram muito: você é burra! Você nunca vai ser ninguém! Você não entende nada! Você não sabe fazer nada! Você não sabe fazer nada! Eu sempre peço aos pais atenção ao que dizem para os filhos, porque eles acreditam. Sabe por quê? Porque são referências; são pessoas que os filhos amam, admiram e confiam. E ainda por cima o agressor e toda a família, todo esse arquétipo da família, é uma pessoa que você está assim: criança é pequenininha, e o agressor é o adulto. O adulto que já teve vivência e sabe o caminho, os enganos, as ilusões, os erros. É ele que tem de compreender, dar o exemplo, ensinar. E quando isso é quebrado e enviesado com a violência sexual ela nunca está sozinha, e pior, ela está com essas outras violências, com assédio moral, com violência física. Todas essas violências vão alicerçando a violência maior. Quando eu tentava falar alguma coisa em casa, eu sempre ouvia isso: Ave Maria! Lá vem tu com as tuas astúcias! Ó menina astuciosa! Menina chata! Menina burra! Tu não sabes fazer nada! Eu acreditei. Crianças e adolescentes vítimas de violências sexuais quando tentam quebrar esse muro de silêncio, esse sigilo intenso, quando chega para alguém para falar é um pedido de socorro desesperado. Quando a gente vira as costas ou não acredita, não credibiliza, questiona, mesmo que em silêncio, a gente percebe. Eu sempre percebi e percebo quando pessoas têm pena de mim no olhar. Eu não preciso de pena de ninguém! A minha história é um movimento político. Eu quero transformar isso em história para modificar, reconhecer os males quando não há intervenção e o que pode acontecer com essa criança, com essa adolescente. Essa história: Ah, quando ela crescer, esquece; isso vai passar. Mas como é que se esquece? Eu vi um caso, um mês atrás, na Record: uma criança de 12 anos estava chegando a casa, foi abordada por um estranho, foi abusada sexualmente. Estupro e abuso é uma coisa só, pelo ou menos para tipificação da lei, atualmente é. Ela não identificou a pessoa, e era um agressor em série. Um cara foi identificado por duas vítimas e foi preso por cinco anos. Passaram 15 anos e essa primeira menina, desde aquele abuso, hoje adulta, dirigindo o seu carro, passou numa rua e viu o agressor, reconheceu automaticamente o cara; depois de ela se tremer, ficar ali paralisada, decidiu segui-lo; ele entrou numa casa, e ela chamou a polícia; ele foi identificado não só por ela, mas por outras vítimas. O outro cara que estava preso por conta dele, infelizmente era parecido fisicamente, foi inocentado. Mas 15 anos depois. Como é que alguém pode dizer que quando uma criança crescer vai esquecer? A gente não esquece nunca. Nunca! Absolutamente nunca! Além de interromper essa violência, alguém fazer a denúncia. A importância da denúncia é importante porque a gente pode transformar isso em política pública efetiva, mais eficaz, pontual, algo muito maior. Quando a gente se cala, além de não conseguir efetivar enquanto política está permitindo que um crime aconteça. É preciso que se compreenda que um abuso sexual é uma violação de direitos humanos. A única pena é aplicada àquela que cabe a lei, e não essa para criança, para adolescente, para criança. Para adolescente a gente precisa de atendimento, de um bom profissional, de uma equipe multidisciplinar para atender essa criança, para atender essa família. Não sei se alguém sabe disso, mas o buraco da violência sexual é muito grande. Eu chamo o primeiro momento de exercício direto de violência porque estava dentro de casa, e esse agressor era um tio, irmão da minha mãe, e tinha todo acesso a mim, ele morava na mesma casa que eu, por isso eu chamo de exercício direto. Ele está dentro da mesma casa que eu, e abusa sexualmente de mim cotidianamente. Poxa Helena, você era estuprada todo dia? Não, não é isso. O estupro é o mais alto grau de violência. Até que o estupro aconteça, o agressor já eliminou toda a liberdade, a efetividade, os direitos de escolha, a autonomia e o bem estar, a autoestima dessa criança; até ele percorreu um caminho absolutamente perverso, vil, para que haja uma transferência de culpa e a criança se admita culpada, tenha vergonha, fica em silêncio. Abuso sexual intrafamiliar acontece no cotidiano, porque é no cotidiano que se garante o silêncio para essa relação perversa existir. Eu sempre digo que a violência vai existir no cotidiano. Ainda nesse primeiro momento dos 5, 6 anos até os 19 e 20 anos, quando eu saio de casa, eu consegui dizer para uma professora minha, mas ela não era uma professora, sabe aquela professora? E pensava: Quando eu crescer, quero ser igual a essa mulher. Ela não era uma professora, ela era à professora, aquela pessoa que você admira. Ora, ela era linda, e eu horrorosa, só tinha orelha, cabelo e olho; era horrorosa, seca, não tinha vida. É para rir mesmo, porque não há de se compreender como é que se deseja uma criança completamente feia, esmagada pela feiura e pela morte, porque uma criança vítima de violência sexual morre um pouco mais todos os dias, até que a violência transborde e ela consiga transvalorar, como dizia Nietzsche: Ela era linda e eu era horrorosa. Ela era inteligente e eu era burra. Ouvia isso todos os dias da mãe, dos meus tios. Eles eram a minha referência, as pessoas que eu amava. Então de alguma formar eu dizia assim: Eles têm razão, eu devo mesmo ser feia e burra. Eu era desajeitada. Sabe aquela criança que tudo quebra e derruba; meus peixes morriam, meus animais tinham que ser devolvidos porque eu não conseguia cuidar. Ela não. Essa professora era genial, inteligente, e ensinava Literatura. Por conta dela, descobri a arte, a literatura; descobri que existia Camões, Cervantes, os poetas brasileiros, Clarice Lispector, que foi que eu comecei a declamar aqui um trecho de um poema dela. Aí eu contei aos trancos e barrancos para essa professora; com muita vergonha, com vergonha do mundo inteiro, eu cheguei: Professora é porque lá em casa... - O que é menina, diz logo! O que é Helena, fala! - Não, professora, é porque meu tio abusa sexualmente de mim. - É o quê, menina? Claro que não foram com essas palavras: meu tio abusa sexualmente de mim. Nem me lembro como foi que eu disse, mas o sentido foi esse. Ela bradou: - Que absurdo! Vamos agora à delegacia. Você tem que entrar comigo agora numa delegacia! Eu devia ter uns 14 anos. Aproximadamente 25 atrás, eu entrar numa delegacia, num contexto onde não se discutia ou se questionava autoridade da família. Como é sim! Na época éramos regidos pelo Código do Menor. Esse período da adolescência foi sendo construído durante a década de 1980, foi uma construção histórica, até lá você não era ninguém, era uma coisa entre a infância e a juventude. E eu contei para ela, e ela queria que eu fosse à delegacia. Eu enrolei, evidentemente. Pensei: Eu vou entrar numa delegacia e falar para um homem que dentro da minha casa, tem outro homem que abusa sexualmente de mim! E eu tenho 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19 anos e não digo nada, absolutamente nada! Claro que não. Ele vai rir de mim, vai chacoalhar na minha cara: você é uma depravada, você é uma vadia. Eu vou morrer de vergonha e vou embora. Pior, a minha mãe vai saber e vai me abandonar; ela vai deixar de amar. Evidentemente que existem todas as culpas, e essa é uma das culpas pertinentes, a relação com a mãe, que é tumultuada, sempre tumultuada. Enganei a professora, disse que ia outro dia e deixei para lá. Abuso sexual intrafamiliar é cotidiano como eu já falei, aconteceram outras vezes. Eu deixei de ser aluna que sentava na frente, e passei ser aluna calada e sentava lá atrás. Ela mim procurou um dia e colocou-me contra a parede. - O que está acontecendo? Por que você não senta mais na frente? O que é que houve? O que é que há? Eu olhei para ela, ainda com muita vergonha, disse: Professora aconteceu de novo. - De novo! Ah, minha filha, não acredito. Diga-me uma coisa Helena, ele estava armado? Naquele momento, toda admiração e respeito que eu tinha por ela morreu, acabou. Eu nunca mais quis ser professora de absolutamente nada, por conta dela. Ela não teve o mínimo de sensibilidade para compreender que agressor sexual intrafamiliar não precisa de um revólver, de uma tesoura, de um canivete; ele não precisa de nada porque ele é a arma! A voz dele é a arma. O olhar dele ameaçador, te vigiando, te julgando é a arma! Os pesadelos que você tem com ele são armas! Ele não precisa de nenhum revólver, de nenhuma faca, de nenhuma tesoura. Esse julgamento que a sociedade comum faz, de que: Ah, mas se fosse eu tinha feito isso... Essa menina gosta. Se fosse você, nada! O seu senso comum não interessa. O que acontece é que você precisa ter alteridade, que é o princípio de ética, de respeito, de você olhar para o outro não com seus olhos, com o seu contexto, com a história, com o seu julgamento. O seu julgamento é o seu julgamento. Ninguém aqui precisa de julgamento. Você precisa olhar por o outro com os olhos dele, tentando compreender mesmo que você não compreenda; e o afeto é esse viés que perpassa até a tua falta de entendimento e o acolhimento do outro. Fugi dela e fiquei em silêncio por muitos anos. Exercício direto é porque acumulei a vergonha, o medo, o pavor de olhar para ele e por medo fazer xixi nas calças, por puro medo, por pavor dele. E a família vai permitindo, como a minha permitiu por omissão mesmo, porque existe uma série de questões que não vale a pena aqui discutir, apenas citar, que existe uma tradição, existe uma coisa bem maior que a criança; e esses mitos fazem com que a família diga assim: Quando ela crescer isso passa, a gente tira daqui e manda para a casa de um parente. Faz-se muito isso: tira a menina da cidade, ou então tira o cara da cidade, manda para o interior, manda para a capital ou qualquer lugar, depois passa, e a menina que se dane! Imagine, com todo aquele contexto, com toda aquela dor. Por muitos anos eu não admitia que fosse vítima de violência sexual. Eu cheguei ao ponto de dizer assim: Isso não aconteceu. Meu tio, Ave Maria, ele é um homem muito bom; minha família é maravilhosa, minha mãe cuida de mim. Admitir que a minha mãe não cuidou de mim; admitir que aquele tio não é bonzinho, não é um cara bacana nem legal, era dizer que toda inferno que estava lá, o tal do cemitério na cabeça era real. E o que eu ia fazer com aquilo? Eu ia fingir que não acontecia? Por muito tempo eu fingia que não acontecia. Aí entra o segundo momento que eu chamo de exercício indireto de violência, é quando eu percebo que se eu continuar dentro da casa da minha mãe eu vou morrer ou porque vou me Se vocês vissem uma foto minha dessa época 14, 13 até os 19 anos, sabe aquele brilho que falta no olho, os brios, a vontade de viver, eu não tinha nada disso, eu era só uma coisa, uma coisa que ia andando, que vestia roupa, que tinha um pouco de cuidado. Existia uma porção de morte, sabia Deus o porquê. Chega o segundo momento e decido sair de casa. Eu toco violão, e descobri que podia tocar violão em troca de um banho na sua casa; duas noites na sua para dormir. Dormir na rua era ruim, apesar de que eu passei algumas noites na rua, dormia na parada de ônibus, dormia no banheiro de uma faculdade, mas eu precisava de um canto; eu tocava num bar, toco lá, faço a festa, me pagam uma cerveja, e dizia que queria ir para a casa de alguém para tomar um banho. Eu passei aquela expressão de ficar de pires na mão para qualquer pessoa. Eu conheci um grande aliado, e foi a pior coisa que conheci: o álcool. Se alguém me perguntasse: Helena você já usou alguma droga ilícita? Não. Eu sempre fui careta demais. Nunca fumei maconha, cheirei pó. Eu nunca fiz nada disso. Se eu tivesse entrado, talvez fosse uma viagem sem volta, eu não conseguiria parar, não porque eu quisesse morrer, na verdade eu queria matar a dor que era imensa dentro de mim. Eu não sabia como. Mas a vontade de tirar aquela dor era tão grande, e o medo das drogas pesadas era imenso também, daí fui para o álcool. A Frida Calo tem uma frase: Eu bebo para afogar as minhas magoas, mas as danadas aprendem a nadar. Era assim que eu fazia. Eu bebia porque a sensação de estar alcoolizada me inebriava; eu não me lembrava de nada, era feliz naqueles 10, 15 minutos. Mas as danadas aprendiam a nadar, e na ressaca vinha toda a dor de novo. Ninguém entendia. Os meus amigos diziam assim: Por que é Helena que você faz isso, por que você não volta para a casa da sua mãe, prefere ficar na rua? Por que você faz isso cara? Você é filha única, volta para sua casa, uma cama quentinha, aqui você corre perigos. Eu tinha mais seguranças na rua do que em casa. Como eu podia voltar para casa? Eu não conseguia dizer nada a ninguém, porque as poucas pessoas para quem eu disse, como essa professora, achava que eu gostava ou tinham muita pena de mim. E a pena não me ajudava, porque eu ficava chorando de lado, a outra pessoa do outro, e não andava para lugar nenhum. Por que eu chamo de um segundo momento de exercício indireto? A mão dele não mim alcança mais, só que as consequências do abuso se agigantaram. Aquele medo que eu tinha de ele ir para a minha rede, à noite, eu passei a ter mede de ele me encontrar no meio da rua. Às vezes, eu achava que sentia o cheiro do perfume dele, e saia correndo destabanada, gritando como louca mesmo. Eu passei essa imagem de louca. Os adolescentes e as crianças vítimas de abuso sexual assumem um comportamento meio que rebelde, descuidado, porque a dor é imensa. Eu não sei se vocês já viram a cratera feita por um meteoro que caiu no Arizona, Estados Unidos, era imensa. E certa dia, em casa, sem pensar em abuso, sem pensar em nada disso, assistindo televisão, passava lá essa matéria no Fantástico sobre a cratera do meteoro no Arizona. Tinha um repórter dentro da cratera, você não conseguia ver o que estava do outro lado porque era muito alto. Ele disse assim: Agora nós vamos sobrevoar a cratera. Quando ele sobrevoou, e eu vi aquela coisa imensa e profunda, eu olhei e disse assim: a minha dor é isso. Eu não tinha noção do tamanho do buraco que existia dentro de mim. Eu só sabia que existia e precisava fazer alguma coisa com isso, porque eu só chorava, sofria, perdia trabalhos, perdia mesmo. Eu cheguei a trabalhar na maior instituição financeira da América Latina, e fui embora ao meio de uma crise. O meu gerente dizia que me dava as minhas férias, mas não deveria abandonar o meu trabalho. E eu disse assim: Poxa cara, eu não posso, porque o que tenho não se resolve em 30 dias. Eu não pedi demissão. Ele mim deu a demissão porque era meu amigo, mas nunca entendeu o que houve comigo. As vítimas de violência sexual intrafamiliar fazem isso, é como se fosse uma autossabotagem, a gente merece sofrer, porque ninguém me respeitou, então por que você precisa se respeitar? Foram histórias extremamente cruéis e dolorosas assim. Eu já tinha perdido namorado, já tinha perdido emprego, já tinha perdido os meus amigos, eu já tinha perdido tudo, e estava na pindaíba, no fundo do fundo, do fundo do poço. E um dia, em casa, muito mal, decidi escrever uma carta sobre mim mesma. O início da carta era assim: Eu acho que esse inferno não vai acabar nunca, minha autoestima é de tamanho de uma formiga. E aí eu escrevo ciosas horríveis sobre mim. Vocês devem conhecer o Orkut, na época estava bumbando igual o Facebook hoje, eu passei um tempo colocando nas comunidades sobre violência sexual. Coloquei a postagem, sem ser anônima, parte dessa carta. Descobri que existiam outras vítimas de violência sexual no mundo. Uma das coisas que acontece com vítimas de violência, é que a vergonha é tão grande, mas tão grande, que você acha que é só você, e daí não falam para ninguém. Imagine que o mundo tem aproximadamente 7 bilhões de pessoas, e só você foi vítima de violência sexual. A vergonha é grande. Como falar para alguém? Como chegar para contar para alguém? Você tem tanta pena de si mesmo, que acha que a pena que o outro tem de você é um reflexo seu, há uma transferência. Nesse momento conheci outras pessoas que tinham sido vítimas iguais a mim. Aí a coisa começou a cair. Eu disse: Mas se existem outras vítimas, quais são as outras mentiras que ele me contou? Eu comecei a pensar que aquelas histórias: Você é burra! Você não vale nada! Você merece sofrer! Você nunca vai ser ninguém! E a pior mentira: a culpa é sua! Eu comecei a questionar as mentiras que tinham me contado. Quando eu comecei a questionar tudo ruiu. Esse é o terceiro momento que eu chamo de a ressignificação. Eu já tinha feito terapia três vezes, mas não tinha conseguido avançar no processo, acho que eu não estava pronta. Dessa vez eu fui e com gosto, com muita vontade. Eu percebi que isso era mentira. Se existem outras pessoas que são vítimas, por que as outras coisas são verdades? Será que eu preciso mesmo carregar essa culpa? Será que eu tenho culpa? Será que eu preciso dessa vergonha toda? Será que eu mereço sofrer? Quando eu comecei a questionar e fui, evidentemente eu tenho referencial da psicoterapia, até porque, no meu caso, não que a psicóloga vá me salvar. A minha psicóloga não me salvou; o que ela fez foi acender uma luz no meio da baderna que estava o meu quadro pessoal, estava tão bagunçado e eu não conseguia ver nada, e sozinha não conseguiria. E, então ela acendeu a luz e ficou: O que é Helena que a gente vai pegar agora? Ah, isso aqui? Como é que você quer arrumar? Eu fui fazendo, ela mim auxiliou. Esse é o papel do psicólogo, sem dramas, sem grandes expectativas. Além de uma escuta qualificada e ativa, ela teve uma escuta afetiva comigo. Quando eu comecei a questionar todas essas coisas tudo ruiu. Daí comecei a escrever um blog: peledecristal.blogspot.com, e o blog se transformou no Pele de Cristal. Eu publiquei o livro. Por quê? Para as pessoas verem que pode acontecer na vida de alguém quando vítima de violência sexual, quando não há intervenção. Na minha época não existia nada, hoje existe. Caso alguma adolescente aqui for ou souber de alguém que foi vítima, ou ainda é vítima de violência sexual, eu espero que essa pessoa saiba que pode contar com o CREAs, com o Conselho Tutelar. Sabe essa história: Eu não quero me envolver porque não tenho nada a ver com isso; se alguém 25 anos atrás, tivesse por acaso se metido na minha vida, a minha história pudesse ter sido outra. Quando não há intervenção a pessoa se perde. Eu sofri um absurdo. Eu sou talvez a grande vingança dessa história toda, porque sou feliz. A violência não conseguiu me matar. A violência não conseguiu me destruir. Por muito tempo achei que aquela violência, que o abuso sexual me definia. Não. Quem me define sou eu. São as minhas experiências. E o abuso sexual é mais uma experiência dolorosa, e a aqui saiu dando rumo a várias histórias, mas não é, em absoluto, o que eu sou. Eu conto para que as pessoas percebam quão dolorosas pode ser essa experiência, e quão possível pode ser para psicólogo, assistentes sociais, promotores, diretores de escola, professoras. Acreditem na sua infância. Psicólogo, quando você chegar para a criança ou para uma adolescente, eu sei o quanto isso é doloroso. Eu já estive dos dois lados do sete. Quando ela vai e dá um passo para frente e você fica animado e, de repente, ela dá dez passos para trás, ela não quer, ela nega, mas isso porque é doloroso dizer. Quando você admite que é vítima de violência sexual precisa fazer alguma coisa com isso; o inconsciente esta lá te empurrando, te questionando, dizendo: faz alguma coisa, não da mais. Quando isso acontece, o apoio, a paciência, a ética, o respeito, o afeto desse profissional é imprescindível. Legitimar a fala da infância, a fala da adolescência, abrindo mão do seu juízo moral, evidentemente todos temos em alguma ordem, em algum nível, buscando o princípio da alteridade, reconhecendo no outro a importância, o sujeito de direito, não o sujeito sem jeito, mas reconhecendo nele um universo igual a você. Talvez você esteja pronto como a minha psicóloga fez comigo: começar a trilhar o caminho. Eu quero terminar dizendo uma coisa: eu sei que nenhum momento eu estou dizendo que é fácil. Eu não estou sendo utópica, estimulando que a denúncia seja feita, dizendo que tudo é show de bola. Eu sei das dificuldades burocráticas, eu compreendo isso. Entretanto, eu acredito que é possível. Primeiro porque somos seres de cultura, e somos os únicos, aliás, que podem intervir na realidade interna, na paisagem interna. A gente precisa reconhecer o outro como esse grande capacitor de fluxo, como diria lá de Volta para o Futuro, capaz de entrar em si e fazer grandes transformações de realidade. Eu sei das asperezas do caminho, mas como diria Tchê: Que endureceram sim, mas sem perder a ternura jamais. Eu tive todos os motivos para ser uma pessoa áspera, cruel, violenta, e eu optei, escolhi e escolho a gentileza. Eu acredito no outro com a mesma possibilidade que eu tenho e sou. A violência não me determina. A violência não me parou e ela não é capaz de parar ninguém, a não ser que nós não tenhamos respeito, afeto, não intervimos nessa realidade. A frase que eu quero deixar para vocês é: “Quando tudo for pedra atire a primeira flor”. (Aplausos). SR. MESTRE DE CERIMÔNIA: Agradecemos a Psicóloga e Escritora, Helena Damasceno pelo sua excelente palestra. Convidamos a Presidenta da Comissão da Infância e Adolescência da Assembleia Legislativa, Deputada Estadual Bethrose, para dar sequencia ao 18o Regional da Campanha Quem Cala, Consente - Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes é crime! Abriremos um momento para algumas perguntas, as outras que ela não responder serão respondidas por e-mail. SRA. HELENA DAMASCENO: Eu posso dar meu e-mail para vocês entrar em contato comigo, quem pode me procurar depois, como já disse meu livro vai está ali a venda a disposição de vocês. A primeira pergunta que me fazem é sempre a mesma. Eu divido o livro novo em duas partes: a história das historiais e as históriais das perguntas. Existem perguntas que são recorrentes, e eu acho que eu preciso dar essa resposta para as pessoas. Qual o fim do seu tio nessa história? Qual é hoje o vínculo com a sua família? No meu caso, eu não pude fazer uma denúncia porque o crime prescreveu. Eu tenho 38 anos, e a última vez que ele abusou sexualmente de mim foi aos 19 e 20 anos. Já se passaram muitos anos. Eu não posso denunciá-lo. Saber o que aconteceu com ele, eu não sei, eu não tenho nenhum contato com ele; eu não vejo, não falo com ele. Nós não temos nenhum tipo de contato. Então dele em si eu não sei nada, e prefiro, porque ele não é significativo na minha vida, de fato, a personagem principal sou eu. A vida dele não me interessa. O que me interessa é que ele seja responsabilizado, infelizmente eu não posso fazer isso de fora legal. O que eu posso fazer é, caso exista alguma denuncia contra ele, eu posso entrar de testemunha, e aí eu entraria com maior prazer.  A outra pergunta com a relação à minha família, com a minha mãe. A relação com a minha mãe sempre foi bem tumultuada. Alguns anos atrás depois de eu ter lançado o Pele, nós começamos a conversar; foi a conversa mais difícil da minha vida, porque eu percebi que ela não acreditava, tendo passado 20 anos, ela ainda não acreditava em mim. Esqueci de dizer que o perfil de um agressor sexual é o daquele cara que você jamais pensaria, imaginária que ele é um agressor. Esse tio está dentro desse perfil. Ele é esse cara acima de qualquer suspeita, bacana, legal; bom pai, bom marido. Ele é bacana. E para a minha mãe era difícil admitir isso. Só que chegamos a um ponto onde eu tive de dizer para ela: Ou ele ou eu, porque não dá para você ficar trazendo ele para a minha vida. Era o que ela queria. Hoje a gente tem uma relação mais afetiva, conversa mais, se respeita mais. Eu acho que ela começou acreditar em mim. Outra pergunta. Sabemos que é uma triste realidade o abuso, pior é a burocracia existente para tomar as devidas providencias. Não temos mais tempo para falar nem em seminários, precisamos agir. O que fazer para a justiça agir efetivamente nos casos já conhecidos nos nossos municípios e Estado? O Conselho Tutelar faz muito, mas os casos estão sem uma definição. Eu sei que a rede ainda é falha, mas eu reconheço o quanto já caminhou. O que de fato, para mim falta, é que a sociedade se comprometa de uma forma única. Não é só escola, não é só o Conselho Tutelar, não é só a família, toda a comunidade, toda sociedade tem que se unir em prol e dizer: vamos acabar com isso! Os casos que já existem e não houve algum tipo de punição, por exemplo, de responsabilização, precisam que sejam encaminhados até o Ministério Público se for o caso, aos órgãos competentes para que haja alguma responsabilização. Acho que foi Bob Marley que disso: Se todos derem as mãos, quem segurará as armas? E a gente ficar apontando o dedo: Ah, é responsabilidade da escola! Não, é responsabilidade da família! É só o Conselho Tutelar. Se a gente ficar focando nas dificuldades não sai do lugar. A gente precisa evidenciar o que já tem e unir as forças, a comunidade como um todo, toda a sociedade. A denúncia é o primeiro passo porque transforma essa ação em política pública. O gestor vai pode dizer: Aqui é preciso intensificar as ações porque tem X denúncia e aumentaram 20%, 10%, 30% num período, é alarmante, precisamos efetivar. Daí as ações são pensadas por toda comunidade. Eu acredito que é uma responsabilidade social de todos. Como e quando eu decidi me tornar psicóloga e palestrante? Foram nos últimos anos. Palestrante a coisa aconteceu, eu não planejei. O percurso foi esse: fui para a terapia, fiz o blog, fiz o livro e comecei a dar palestras, porque eu entendi que é uma forma de dizer para as pessoas: isso pode acontecer; mas existe o outro lado, a pessoa pode também reinventar-se. Não é porque a pessoa foi vítima de violência que tem uma vida inteira determinada de sofrimento. Não. A gente pode intervir, pode ajudar, a gente pode auxiliar e essa pessoa junto com a gente pode crescer e tornar-se outra coisa. O fato de ser psicóloga é porque eu sempre digo isso: eu tive um flerte com a sociologia; a literatura, a música e a fotografia são minhas amantes, sempre serão, mas para casar e ter filhos, aquele negócio de família é com psicologia, eu nasci para isso mesmo. (Aplausos). Outra pergunta. Embora exista hoje uma rede de proteção que apóia e ajuda as vítimas de exploração sexual... eu acho que é para resgatar sua autoestima; sabemos que o papel da família é fundamental nesse processo. Você poderia explanar um pouco sobre a importância dos vínculos familiares e como sistema de garantia dos direitos atua. Os vínculos familiares, a gente precisa compreender que eles são os elementos principais na violência. Quando a gente fala de atendimento à vítima, de intervir na violência, eu compreendo que eu preciso intervir na criança ou na adolescente ou no adolescente e na família. Essa família precisa começar rever esses estigmas, essas funções que estão ali meio que favorecendo, facilitando a existência de uma violência. Para mim esses vínculos familiares são importantes, primeiro porque são eles que possibilitam que a violência exista. Segundo, são eles que possibilitam a intervenção dessa violência. Existe um documentário chamado Flor de Pessegueiro, é fantástico, é sobre uma raridade. As mães que souberam que as filhas eram vitimas de abuso pelo pai ou por alguém da família, e elas acreditaram, e foram as últimas instâncias na defesa dessas filhas. Essas crianças hoje são adultas, são mulheres, eu sou amiga da Nair, e elas são mulheres fantásticas, porque tiveram apoio da família. O apoio da família é imprescindível. Mas quando a família favorece essa violência, é preciso que haja uma atuação sobre essa família de forma complexa, ampla, não é só atender a criança; atende a criança, atende a família, às vezes há uma transgeracionalidade, a mãe também foi vítima de outras violências ou também de violência sexual. Essa violência é transgeracional, vai passando de uma geração para outra. É preciso também compreender e atender essa família. Que ajuda você teve para passar por tudo isso? Você conseguiu passar por tudo isso sozinha? O que você recomendaria para alguém que foi vítima e até hoje não falou por vergonha, ou talvez medo do que os outros vão dizer. Quando eu falo que a pessoa precisa falar para alguém, não é sair falando, é você encontrar uma pessoa de referência, uma pessoa que você confia ou que acha que pode confiar, e conversar com essa pessoa, e esperar que essa pessoa te acolha e te dê afeto. Isso por si só é um elemento. Agora você precisa de atendimento. Uma coisa é você conversar com amigo. Por isso que quando eu conversava com meus amigos eu não conseguia fazer nada. Eu ficava chorando de um lado e a pessoa do outro. Por isso que precisa de um atendimento. Daí a importância do profissional da psicologia, porque é com esse processo psicológico que você vai poder reavaliar, ressignificar essa relação, inclusive sua com a violência; sua com essas pessoas que de alguma forma facilitou o abuso ou a exploração sexual. Vocês sabem qual a diferença entre abuso e exploração sexual? As duas coisas são violências, mas o abuso sexual é uma relação que acontece sempre de alguém em maior desenvolvimento emocional, psicológico que outro. É sempre de um adulto para uma criança, ou de um adolescente para uma criança. Não necessariamente toda criança que foi agredida sexualmente se tornará um agressor, mas existem pesquisas que indicam que a maioria dos agressores sexuais foram vítimas de abuso em algum momento de sua vida. A exploração sexual se dá quando há essa violência, só que é eu troco, eu pago para ter uma conveniência sexual, a diferença é porque a gente chama de exploração sexual comercial. Existe um comércio, uma barganha, para que a criança e o adolescente troquem o sexo por alguma coisa: um banho, uma moeda, dinheiro. Eu tipifiquei para vocês compreenderem. Eu não consegui passar por tudo isso sozinha. Eu tive o apoio de uma psicóloga, e fiquei em terapia por um tempo, um processo único, exclusivamente para trabalhar o abuso. Tudo que está no Pele, tudo que eu já vivi em relação ao abuso sexual está muito bem trabalhado.   Além do medo não se construiu em você o sentimento de vingança? Não deu vontade de matar o agressor? Afinal o que ele fez foi horrível! Claro que deu. Lógico que tive sentimento de vingança, afinal de contas eu sou humana. Lógico que tive vontade de matar. Quando eu era adolescente arquitetava planos mirabolantes para me vingar dele. Amadureci. Percebi que se eu me vingasse dele, eu estaria me tornando algo que eu critico; algo que eu sempre disse que não queria. Ele é o criminoso, eu não, eu não cometi crime nenhum. Se eu me vingo, eu me torno uma criminosa também. O que eu espero é a responsabilização legal. Eu sou a maior vingança porque eu sou feliz. A minha vingança é ser feliz. Eu não estou dizendo que o perdoei. São duas coisas diferentes. O que eu digo é que eu não fico mais agarrada naquele sentimento dizendo assim: Ah, eu quero que ele se lasque! Ah, eu vou pegá-lo e vou matá-lo! Não. Eu não quero nada da vida dele. Eu não quero saber dele. Eu não quero nada, absolutamente nada. Eu quero ser feliz. Eu descobri que eu não sou feia nem burra e posso ter qualidade de vida. Eu sou linda, inteligente, por que eu preciso perder o meu tempo com um ser humano tão infeliz? (Aplausos). Quando a criança com cinco anos tem obsessão por tocar os órgãos genitais, tanto dele quanto dos outros, é sintoma que está sendo abusado? Pode ser. Criança de cinco anos está dentro dessa face freudiana, que ela vai olhar a frauda do outro, a cueca do outro, puxar e dizer assim: Ah, o teu não é igual ao meu por quê? Isso se for isso faz parte. Na verdade, a gente não pode ficar focando em uma coisa. Existe uma série de elementos, uma série de indicadores que juntos, a gente pode ficar pensando: essa criança pode estar sendo abusada. Não é porque a criança está olhando o órgão genital de outra pessoa e o dela que obrigatoriamente esteja sendo vítima de abuso. Se existem outros elementos além desses, como marcas no corpo, doenças sexualmente transmissíveis, a criança tem dificuldades de sentar ou tem dificuldade de engolir; se ela representar medo excessivo de alguém, se existem outros elementos, aí sim, cabe à pessoa ou ao responsável ou alguém chegar e tentar conversar com essa criança ou já direto fazer a denúncia e encaminhá-la. Por que eu digo para fazer logo a denúncia? Porque o papel da denuncia é intervir na violência. O papel de investigar a denúncia não é de faz a denúncia, apesar do que a pessoa que faz uma denúncia, ligando para o Disque-100, é garantido o anonimato, sigilo absoluto, e pode acompanhar. Você fica com o número de protocolo, e um mês depois nada aconteceu, liga informando que fez uma denúncia, diz o número do protocolo, e quer saber o que foi que houve, porque a criança continua sendo vítima, eu acho que ela está sendo abusada. Pelo amor de Deus denunciem, é imprescindível que você denuncie. Em relação a essa pergunta tanto pode ser como não. Como é que pode ser? Se for juntos com outros elementos. Se um fato isolado ela está fazendo que todo mundo fez, olhar para o outro: é diferente do meu. (Aplausos).   SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS: Agradecemos a Escritora e Psicóloga Helena Damasceno, pelo brilhantismo da sua presença. Convidamos a Presidente da Comissão da Infância e Adolescência da Assembleia Legislativa, Deputada Estadual Bethrose, para dar sequencia ao 18o Seminário Regional da Campanha, Quem Cala Consente - Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes é Crime! SRA. PRESIDENTE DEPUTADA BETHROSE (PRP): Nós estamos quase chegando ao final. Eu gostaria que vocês pegassem esse material e fossem para penúltima página: Construindo o seu PAE, são onze passos; no seminário de hoje realizaremos dois passos. Após, entregaremos o certificado para cada participante, a seguir o almoço.  Primeiro passo. Vocês vão colocar o nome de um gerente e de um secretário, juntamente com nome da escola, o município e o contato (e-mail, telefone fixo e celular desse gerente e secretário), para a Comissão entrar em contato e acompanhar esse Plano de Ação Estratégica. Segundo passo. Identificar a rede de proteção social do seu município: alunos, o professor ou o diretor da escola, os conselheiros tutelares do seu município; alguém do CREAs, alguém do CRAS, para poder escolher esse gerente, um secretário e um coordenador; só que o coordenador tem que ser um por município; e o gerente e secretário por escola. Terceiro passo. Deve ser realizado no seu município. O secretário entrará em contato com a rede e convidar a todos para uma reunião. Quarto passo. Dia da reunião, reunir a rede e elaborar 10 ações bem práticas, utilizando recursos materiais já existentes como caminhada, palestra para os professores e pais da educação infantil, para falar sobre os aspectos comportamentais de uma criança poder ser abusada tanto também os fatores físicos. Tem uma página muito interessante: como proteger nossas crianças; é um material muito bom para ser uma das ações. Por exemplo, a quinta: selecionar com bastante atenção os adultos cuidadores de crianças e adolescentes; Orientar as crianças e adolescentes estarem sempre com outras crianças em determinadas situações como o passeio de escola, evitando manter-se isolada do grupo; Ensinar a criança e o adolescente a não aceitar convite, dinheiro ou favores de estranhos. Essas são orientações que vocês podem fazer com os pais da educação infantil. Quinto passo. Numerar as atitudes definindo o prazo de realização, material necessário e passeio. Sexto passo. Colocar as ações. O que vamos precisar? Quem vai providenciar? Quando vamos realizar os parceiros e o coordenador da ação. Sétimo passo. Depois de elaborado o seu Plano de Ação Estratégico, enviar para a Comissão Criança e Adolescência. Oitavo passo. Desenvolver, executar o seu plano no prazo de seis meses. Nono passo. Construir o seu relatório final bem prático colocas só o município, a escolar, como aconteceu, o público-alvo, o impacto gerado e os registros fotográficos, principalmente os registros fotográficos. Décimo passo. Encaminhar seu relatório ao Crede e à Comissão da Infância contento todas as ações do Plano de Ação Estratégicas. Décimo primeiro passo. Aguardar a entrega do selo Escola Cidadã, pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará. Chamarei os seis municípios coordenados pela 15º Crede de Tauá. Cada município que eu chamar vai fazer um círculo para a Comissão entregar um papelzinho para vocês colocarem o nome do secretário, o gerente e o coordenador que serão escolhidos por vocês mesmo. Aiuaba, Arneiroz, Quiterianópolis, Parambu e Tauá. Passarei a entregar o certificado aos representantes dos municípios: Parambu, Aiuaba, Arneiroz, Quiterianópolis. Eu gostaria de agradecer a presença de todos os municípios que compareceram, Aiuaba, Quiterianópolis, Parambu, Arneiroz e Tauá, agradecer aos representantes dessas escolas na pessoa da coordenadora da 15º Crede de Tauá, senhora Marluce Torquato; agradecer todos os conselheiros tutelar, os profissionais do CREAs, todos os alunos, e de coração, agradecer a presença de todos. Muito obrigada. Este evento só pode ser realizado devido o apoio do Presidente Assembleia, Deputado Roberto Cláudio. Fiquem agora com a banda Quarto Nove. Boa tarde para todos.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   

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